“Todas as crianças são artistas. O problema é como permanecer um artista quando crescemos”.
Quando Pablo Picasso fez esse comentário muitos talvez não tenham compreendido, na época, o real valor do que o mestre queria dizer, e sem dúvida muitos hoje ainda não compreendem ou não dão a importância devida.
Com as recentes discussões a respeito da criatividade, tudo o que envolve essa habilidade, inata ao ser humano, e sua importância para o futuro das empresas e negócios do século XXI no mundo, é sabermos porquê ao longo da vida as pessoas se tornam tão eficientes para realizar tarefas mecânicas, burocráticas e analíticas, e tão medíocres quando são desafiadas a trazer uma ideia nova para a empresa. Tão pouco inovadoras para tentar fazer diferente ou mais rápido algo que até então imaginavam ser imutável.
Hoje há em alguns países um amplo debate que repensa e questiona os sistemas educacionais que há 200 anos – desde a Revolução Industrial – não se atualizam e mantém crianças e jovens direcionados apenas para o trabalho profissional e muito pouco para as habilidades de pensar, brincar e criar.
David Kelley, fundador de uma agência global de inovação – Ideo, diz que somos ensinados na escola a apenas pensar de forma analítica, onde tudo é um sistema e o pensar linear é o meio para atingir sucesso profissional. Nada de mal nisso, entretanto, a negligência com que escolas, universidades e pais de um modo geral tratam a imaginação, a intuição, a criatividade e o pensamento criativo nos leva à reflexão preocupante de que estamos educando nossos filhos para serem tudo menos criativos, originais e inovadores. As consequências disso em um mundo cada vez mais competitivo e carente de novos negócios, novas ideias e soluções para questões econômicas, políticas, ambientais e sociais, tendem a ser devastadoras.
A escola mata a criatividade?
Ken Robinson, consultor educacional para o governo britânico vai mais além. “A escola mata a criatividade”. Ele defende que preservar e estimular a imaginação e a criatividade de crianças e jovens deveria ser tão importante quanto alfabetizar ou ensinar matemática. E que a escola de hoje de forma severa estigmatiza o erro.
Eu não diria que a escola mata a criatividade, mas a reflexão é válida e um novo modelo educacional deve ser discutido. O atual sistema educacional em diversos países do mundo, inclusive no Brasil, destaca a linearidade, a avaliação, a punição e ainda condena o erro e o diferente. Crianças e jovens se tornam cada vez menos brilhantes, menos inovadores, menos originais e mais inseguros, propensos ao trabalho sistemático, executivo e mecânico que lhes tragam segurança e os mantenham o mais longe possível do erro.
Nessa linha, o ser humano tende a escolher a fuga e não tentar o novo, procurando sempre a zona de conforto, onde ele raramente cria, não observa diferentes visões e fatalmente leva sua vida inteira se arrastando em um trabalho seguro, prático, confortável, mas que não lhe traz significado algum.
O sociólogo italiano, Domenico De Masi diz: “A sociedade ideal deveria ser uma mistura entre a razão e a emoção, a racionalidade e a criatividade. E não muito de um e pouco (ou nada) do outro”. Em cima disso afirma também que cada vez mais estudantes optam por profissões consideradas lucrativas e deixam de lado seus sonhos e ideais pelo simples medo de errar e por não sentirem-se criativos o suficiente para fazer algo novo e de que gostem. “É preciso predispor os jovens à inovação, ajudá-los a reduzir suas resistências às mudanças. A família e a escola encarregam-se de acompanhar progressivamente as crianças da fase da brincadeira alegre à fase do trabalho triste. A escola de hoje é uma repressão da alegria e da criatividade que limita e mata o potencial criativo das crianças pouco a pouco”, argumenta.
A base da criatividade é a imaginação
Observe uma criança brincando. Ela faz o que gosta, se diverte e o resultado é sempre algo inusitado e criativo. Quando pedimos para uma criança fazer algo completamente novo e desafiador, ela no mesmo instante aceita, sem medo do ridículo, do erro ou da crítica. Ela aprende, erra, tenta novamente, acerta e dessa forma está pronta para assimilar uma nova habilidade.
A base da criatividade é a imaginação que, por sua vez, é alimentada pela intuição. Algo que perdemos pouco a pouco ao longo da vida, muito por nossa própria culpa. Uma criança até os cinco anos de idade ainda não está envolvida em formas e repertórios educacionais e culturais pré-estabelecidos e tem na intuição e imaginação suas maiores forças para expressar seus desejos, sonhos e vocações. Ela cria de forma livre e original. Nós, adultos, matamos a originalidade e o criativo, pois fomos treinados para tudo na vida menos para lidar com nossas emoções, imaginação e intuição.
Repararam que as boas lembranças da escola vêm das brincadeiras com amigos, aulas de arte, educação física, música?
Pois é, não é à toa. No jardim de infância então, crianças livres e cheias de vida são estimuladas em um ambiente criativo onde diversos projetos e disciplinas são aplicados e construídos com práticas inovadoras, lúdicas, onde a escola se torna não apenas um meio para busca de conhecimento, mas também um meio para aprender livremente, errar, acertar, se relacionar, se divertir e sonhar.
A criança autêntica não aceita se deixar formatar pelo medíocre e pelo óbvio desinteressante. Tudo isso traz algo fundamental a elas: significado. Por que adultos fazem justamente o contrário no trabalho e ainda não buscam significado para o que fazem? E as empresas continuam extremamente burocráticas quando dizem que querem inovar? Com o tempo boa parte das escolas, salvo algumas exceções, tornam-se chatas, desinteressantes, punem os erros, nivelam pela mediocridade e não desenvolvem os talentos individuais de jovens.
Alguma relação com algumas empresas não é mera coincidência. Quando deixo minha filha de cinco anos na escolinha todos os dias, penso – “porque as universidades e as empresas não passam um tempinho olhando como são divertidos e sábios alguns poucos momentos no jardim de infância?”. Quer ser criativo, volte ao jardim de infância e recupere o sentido do aprender com experiências, prazer e significado.
Pingback: Porque ensinar empreendedorismo na escola