A sociedade do consumo e das modas instantâneas idolatra, sempre de forma passageira, teorias, atitudes e ações que se apresentam como aquelas enviadas para salvar o mundo do aparente caos em que se encontra.

Vivemos numa sociedade messiânica, que não mais conseguindo articular suas ações e forças para superar as crises, fica sempre à espera de algo carregado de messianismo. Na educação não é diferente uma vez que esta sofre as mesmas influências que a sociedade experimenta.

A sociedade moderna se alimenta desta ideia que, de repente, do nada, como resultado de uma vontade divina, as coisas surgem e nos salvam da catástrofe iminente. Alguns educadores até assumem a ideia de que foram “agraciados” por Deus, para levar-nos ao paraíso.

Vivemos numa diversidade de metodologias de ensino das quais muitas delas se apresentam na condição de revolucionárias, com a pretensão de salvar o desastre da educação brasileira que, diga-se de passagem, não é resultante de usos equivocados de metodologias, mas sim, de gestão.

De certa forma é assim que se apresenta de forma mais recente as metodologias ativas, o ensino híbrido, a educação positiva, entre outras.

Neste momento vamos nos ater apenas em analisar a Metodologia Ativa. Metodologia que na essência nada tem de novo, na verdade é muito mais antiga do que se pensa, e podemos dizer que realmente produziu uma revolução na história da humanidade.

A origem da Metodologia Ativa

Vamos recuperar um pouco das origens da Metodologia Ativa, levando em consideração as condições históricas do momento de seu surgimento.

De certa forma o que caracteriza o núcleo da Metodologia Ativa é a inversão dos papéis sociais entre quem deseja e deve ensinar e quem deseja e precisa aprender, em outras palavras, entre professores e alunos.

Nas metodologias tradicionais o professor assume a função de exposição do conhecimento, e os alunos a função de recebedor. Um expõe e outro recebe. No máximo o que existe, em se tratando de ensino fundamental e médio, é uma rara e precária troca de diálogo, normalmente, muito mais resultante do posicionamento reacionário de alguns alunos do que por planejamento metodológico do professor. Simplesmente acontece, mas sempre se apresenta com vida curta. São momentos, lampejos e nada mais, pois raramente se transformam numa teia de aranha. Podemos dizer que se parecem mais como raios em dia de chuva, mas de intensidade pequena.

Um dos principais fundamentos da Metodologia Ativa é que o conhecimento se constrói a partir de uma dúvida, de uma pergunta, de uma indagação sobre o próprio conhecimento que se tinha até o momento, pedagogicamente preparado. A sua intenção é lançar uma espécie de arpão em direção a um alvo que deve ser atingido, nem sempre de forma precisa, mas o importante, em alguns casos, é simplesmente acertar o alvo.

É possível afirmar que a Metodologia Ativa se caracteriza necessariamente por provocar sempre uma chamada para um “embate” de ordem cognitiva. Deve começar por uma questão que nos retire da zona de conforto, que nos provoque, que nos faça ter no início um certo incômodo, às vezes, até nos chateia. Em alguns casos, a pergunta inicial e motivadora se apresenta como se fosse um raio estrondoso que acaba de cair sobre nossa cabeça, fazendo com que algumas pessoas se sintam até desorientadas.

Sócrates e a Metodologia Ativa

Diante do exposto podemos afirmar com bastante convicção que esta forma de ensino e aprendizagem no mundo ocidental, teve início com a figura de Sócrates e o desenvolvimento do que Sócrates iria chamar pela boca de Platão de “maiêutica socrática”, ou como o próprio Sócrates dizia, a arte de “parir ideias”, pois ele se considerava uma “parteira de ideias”.

Sabemos que todo “parto” tem como resultado o surgimento do novo, mas que necessariamente se origina no antigo e ainda, que todo parto sempre produz dores, desconforto e alguns, podem até resultar em uma hemorragia que pode levar a parturiente e sua “cria” à morte.

O filósofo e profundo conhecedor da filosofia grega Francis Wolf nos ensina que Sócrates era um “ponto de interrogação ambulante” e fora ele, através de seus diálogos, todos eles escritos por Platão, quem tirou a filosofia do diletantismo da Academia, para levá-la para as ruas e assim, estar acessível não a todos, mas para aqueles que tinham capacidade de articular o “logos” (linguagem) com a realidade política que os cercava.

Jacques-Louis David, “A Morte de Sócrates”. 1787.

Os diálogos socráticos conduzidos pela “maiêutica” trazem junto de si a presença da dúvida, a certeza de que quase sempre o que pensamos saber, nada mais é do que uma “doxa”, uma “opinião”, e não o verdadeiro conhecimento e então, surge alguém para desmoronar o castelo de sabedoria da vítima escolhida para o seu diálogo, provando que o mesmo tinha apenas um castelo de areia, que facilmente é destruído pela água do mar ou da chuva, pois as partículas de areia que o compõe, não tem coesão suficiente para mantê-lo de pé.

Em filosofia costumamos dizer o diálogo socrático é sempre aporético, está a “flor da pele”, não se aprofunda, mas incomoda, tal qual uma coceira, destas resultantes da mordida de um pernilongo, pois não é profunda, mas nos incomoda muito.

Na verdade, o que Sócrates pretende nos mostrar é que a sua máxima é coerente com a natureza humana, ou seja, “sei que nada sei”, em outras palavras, temos apenas a sensação de que sabemos, mas jamais a certeza, sendo assim, é melhor continuar a busca pelo conhecimento.

Se nos atentarmos bem esta estrutura está presente na Metodologia Ativa, dentro da qual apresentamos uma questão, uma dúvida, uma pergunta, a seguir construímos o que sabemos de imediato sobre a questão e a seguir, caminhamos em direção a procurar respostas para a mesma, tendo sempre a consciência que jamais esgotaremos este conhecimento, face a condição de finitude de nossa existência.

É óbvio que nenhuma metodologia pode afirmar que ela nos conduzirá ao conhecimento absoluto de tudo que está posto no mundo. Se ouvir um discurso de que isto é possível, se recolha na humildade necessária a todo educador e procure outro caminho, porque com certeza, este que se propõe como sabedor de tudo, não será o caminho correto. Ou será que podemos afirmar com absoluta certeza que o Google sabe tudo?

Contudo, apesar da estrutura originária da metodologia ativa advir do pensamento socrático, é necessário ressaltar que este pensamento nunca a nominou como tal, e tão pouco, imaginava que a sua maiêutica poderia ser aplicada numa escola. Mas nem por isso, não podemos realizar reflexões filosóficas sobre a mesma.

Finalizando, para os educadores que desejam se aprofundar na Metodologia Ativa, é fundamental uma leitura e estudo mais aprofundado nos diálogos socráticos, como forma de auxiliar na construção da pergunta norteadora que irá disparar nos alunos, o interesse por se aprofundar no tema proposto. Outro aspecto importante é o fato de aprendermos muito com Sócrates a como dar continuidade ao diálogo, quando tudo se apresentava como perdido ou interrompido. Recomendo começar pela obra Críton ou Do Dever, mas sempre utilizando boas traduções, com aquelas da Abril Cultural da década de 70.

realidade-alunos
Previous article Projetos escolares: conteúdos que dialogam com as realidades dos alunos
Next article A Finlândia irá se tornar o primeiro país a abolir a divisão de matérias

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Close