Conheça como o país vem integrando a educação financeira às escolas e o que podemos aprender com sua experiência
A educação é um direito, mas também um instrumento de transformação social. E quando falamos em educação financeira, falamos em autonomia, responsabilidade e cidadania.
Nesta edição da série Educação pelo Mundo, vamos comparar como Brasil e Argentina vêm construindo suas estratégias para integrar esse tema às escolas, e o que a educação financeira pode ensinar às novas gerações dos dois lados da fronteira.
Educação financeira: um novo olhar para o currículo
A educação financeira nas escolas deixou de ser uma discussão periférica para se tornar um tópico das agendas educacionais da América Latina. Tanto Brasil quanto Argentina enfrentam altos níveis de desigualdade, consumo impulsivo e endividamento familiar.
Formar jovens capazes de lidar com o dinheiro de maneira consciente passou a ser uma demanda urgente.
No Brasil:
- A educação financeira passou a integrar a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) como tema transversal.
 
- Alguns estados e municípios, como São Paulo, vêm promovendo projetos e formações docentes para implementar o tema desde o Ensino Fundamental.
 
- Iniciativas com cartilhas, oficinas, minicursos e projetos interdisciplinares têm ganhado força, especialmente no Ensino Médio.
 
- A ênfase costuma estar em planejamento, poupança, consumo consciente, juros, investimentos e combate ao endividamento.
 
Na Argentina:
- A educação financeira tem sido abordada por meio de planos nacionais, legislação federal e iniciativas regionais.
 
- O país aprovou em 2025 uma Recomendação no Parlasul para a criação de um Programa Regional de Alfabetização Financeira nas escolas de Ensino Médio.
 
- Os conteúdos incluem orçamento familiar, cibersegurança, criptomoedas, direitos do consumidor e acesso aos serviços financeiros.
 
- A proposta é integrada ao Plano Educacional Anual Federal, com formação docente e apoio intersetorial.
 
Tanto o Brasil quanto a Argentina reconhecem a necessidade de uma abordagem que vá além dos números — e que trate de escolhas, consequências e bem-estar financeiro de forma contextualizada e acessível.
Um tema que começa cedo, mas precisa ser levado mais a sério
Apesar dos avanços em políticas públicas, na prática, a educação financeira ainda dá os primeiros passos na maioria das salas de aula, seja no Brasil ou na Argentina.
Na Argentina:
A Educação Infantil e Primária têm como foco o desenvolvimento de competências básicas em linguagem, matemática e ciências, com possibilidade de inclusão de temas financeiros em projetos interdisciplinares.
A maior integração ocorre no Ensino Médio, especialmente no ciclo orientado (15 a 17 anos), com escolas técnicas e programas voltados para o mundo do trabalho. Os temas são trabalhados de forma interdisciplinar e crítica, respeitando as realidades locais e a diversidade cultural.
No Brasil:
O tema aparece com mais frequência a partir do Ensino Fundamental II, geralmente nas aulas de matemática ou projetos extracurriculares.
No Ensino Médio, cresce a adesão a programas em parceria com instituições financeiras, ONGs e plataformas de ensino. No entanto, a desigualdade regional ainda é um obstáculo: falta formação docente estruturada e materiais acessíveis para muitos contextos escolares.
Enquanto a Argentina avança na criação de um programa regional articulado com o Mercosul, o Brasil precisa caminhar para a consolidação de uma política nacional mais robusta e equitativa.
Educação financeira e cidadania econômica
Mais do que aprender a poupar, os jovens precisam entender o funcionamento do sistema financeiro, seus direitos como consumidores e os impactos do consumo na economia e na vida pessoal.
A Argentina reconhece isso em sua abordagem curricular, buscando:
- Reduzir desigualdades sociais por meio da alfabetização financeira.
 
- Preparar os jovens para decisões assertivas em um mundo digital e cada vez mais conectado.
 
- Integrar temas como segurança digital, fintechs, uso de cartões, Pix, QR Code e moedas digitais.
 
No Brasil, também surgem propostas voltadas para:
- Prevenção ao endividamento
 - Planejamento de carreira e vida
 
- Empreendedorismo juvenil
 
Mas é comum que esses conteúdos ainda dependam do esforço isolado de professores engajados ou da atuação de parceiros externos.
O papel dos professores: da matemática ao protagonismo
Nos dois países, os professores são os grandes condutores dessa transformação, mas também enfrentam desafios semelhantes:
- Falta de formação específica em finanças e economia.
 
- Carência de materiais didáticos contextualizados.
 
- Sobrecarga de conteúdos e pressão por resultados em avaliações externas.
 
Por outro lado, muitos educadores, ao inserirem temas como leilão, juros, inflação, crédito e investimentos nas aulas de matemática, geografia ou projetos interdisciplinares, relatam maior engajamento dos alunos e melhoria na compreensão do mundo real.
Exemplo prático no Brasil: professores do Ensino Médio usam encartes de supermercado, tabelas de financiamento e planilhas de orçamento doméstico para ensinar matemática financeira na prática.
Exemplo na Argentina: conteúdos como orçamento familiar, segurança digital e consumo consciente são trabalhados junto com temas de cidadania, respeitando as diferentes culturas e contextos sociais.
Uma fronteira que inspira conexão
Brasil e Argentina compartilham uma história de desafios econômicos, desigualdades sociais e juventudes que precisam ser preparadas para um futuro incerto e complexo.
A educação financeira nas escolas é uma oportunidade concreta de romper ciclos de pobreza, empoderar cidadãos e construir economias mais saudáveis. Ela não é apenas matemática: é ética, autonomia, cultura e cidadania — e deve ser ensinada em linguagem acessível, próxima da realidade dos alunos.
Ainda há um caminho a ser trilhado em ambos os países, mas os primeiros passos já foram dados. Agora, o desafio é transformar boas iniciativas em políticas permanentes, com apoio aos educadores e foco no desenvolvimento integral dos estudantes.
Como seria o Brasil e a Argentina se todos os jovens saíssem da escola sabendo como planejar sua vida, seu dinheiro e seu futuro? A resposta começa com o que ensinamos hoje.